Era uma vez um peixe. Desde as primeiras horas da infância, as dúvidas que boiavam no oceano eram acostumadas a descer da superfície para apunhalá-lo. E como todo jovem, é claro, transmutava qualquer aflição em combustível. As dúvidas serviram para direcioná-lo em uma busca implacável pela verdade. Seu nado mudou quando conseguiu elaborar uma hipótese, e começou a se parecer mais com um pescador com uma isca no anzol do que com um peixe. Sua intuição o aconselhava a não se aprisionar nos livros encharcados que os humanos deixavam afundar nas águas selvagens e assim o fez. Enquanto nadava, comia bichinhos, fugia dos bichões, morava em corais e fazia filhotes. Nadou todos os altos, também nadou todos os baixos, nadando por todos os meandros da vida sem que a vida mordesse aquela isca.
Lutou o tanto quanto pôde para que a natureza não o levasse de volta ao pó, mas na hora do veredito, deu de cara com Deus.
Sem medo e sem demora, o animal perguntou:
— Senhor, por que o peixe nada, nada, nada e não sai da água, tal qual o homem aprende, aprende, aprende e continua ignorante?
Deus estendeu seu indicador esquerdo para brincar carinhosamente com as nadadeiras do peixe e fazê-lo rir, e apenas depois disso que disse:
— Meu filho, você é uma metáfora.
Foi como se o peixe tivesse sido arremessado fora d'água por um remo, borbulhando bolhas de orgulho até descansar por uma eternidade naquela sensação.