Um pequeno lobo e sua mãe cruzavam uma loja de eletrônicos. A loja era só mais uma espremida naquele centro comercial, não que isso desmerecesse o arsenal que ela exibia sem nenhuma ordem. Letreiros pontilhados por LEDs, cadáveres de metal e plástico descansando no chão ou em prateleiras, além de fios e fios de fios; estava sutilmente desenhado ali um tipo de inferno, ao passo que o local se desdobrava para o pequeno lobo como uma peculiar loja de brinquedos. Encantou-se de imediato com uma Ferrari em miniatura que funcionava como rádio, podendo ser controlado pelos botões acoplados no capô. O chiado parecia querer entregar uma sintonia, então ajustou a antena, mas o som não alcançava sua audição. Ao aproximar a sofisticado bugiganga do seu ouvido esquerdo, ele ouviu:

— Assim como Narciso, nos apaixonamos pelo nosso próprio reflexo nas águas da fonte que dão vida à nossa singularidade. Ao morrer, Narciso é poupado de uma eternidade pobre e constante, onde não há nada além dele. A mesma benção, entretanto, não cairá sobre nós.

Devolveu o suposto brinquedo à prateleira, chateado; não pelo preço, até porque não estava etiquetada. É que a mãe o chamava repetidamente do fim do corredor da loja, mas o consolava lembrar que antes de casa, precisavam ainda passar na padaria.